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Justiça manda empresa pagar sobreaviso por uso de celular

Segundo afirma o tribunal, o empregado ficava à disposição da empresa durante finais de semana, podendo ser contatado via celular.

Uma empresa de telecomunicação vai pagar sobreaviso por deixar um empregado com celular funcional à sua disposição nos finais de semana. O argumento de que o trabalhador só seria chamado em casos remotos, o que não impediria a realização de atividades sociais, não convenceu o Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, que confirmou decisão de primeira instância. A sentença considerou a peculiaridade do caso, mas já é pacífico, inclusive no Tribunal Superior do Trabalho, que só o uso do telefone não configura tempo à disposição do empregador.

"Parece-me que o TRT, com o devido respeito, se equivocou, pois segundo constou, a empresa não exigia do empregado a permanência em sua residência, dispondo assim o ex-empregado de tempo para se dedicar à ocupação que pretender, até mesmo a seu lazer", afirma a advogada Luciana D'Oliveira, do Crivelli Advogados Associados.

No caso, a 10ª Turma do TRT confirmou sentença da Vara do Trabalho de Cruz Alta, que determinou o pagamento de horas de sobreaviso a um trabalhador da Engenharia de Telecomunicações e Eletricidade Ltda. (ETE).

Segundo afirma o tribunal, o empregado ficava à disposição da empresa durante finais de semana, podendo ser contatado via celular. A ETE é prestadora de serviços da Brasil Telecom, atual Oi, que figura na ação como segunda reclamada. A decisão definiu o período entre as 12h do sábado até as 8h de domingo, sempre no primeiro final de semana do mês, como regime de sobreaviso, durante a vigência do contrato de trabalho do reclamante. Ainda cabe recurso ao TST.

O Tribunal Superior, em maio desse ano, transformou uma orientação jurisprudencial (OJ 49) na Súmula 428 e reiterou o entendimento de que o uso de aparelhos como bip, "pager" ou celular pelo empregado não caracteriza, por si só, o regime de sobreaviso, "uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço", conforme o dispositivo. Isso porque, segundo Luciana, o empregado não necessita permanecer em sua residência, inexistindo, portanto, restrição ou mesmo um elemento psicológico que o impeça de fruir de sua liberdade.

De acordo com o advogado Filipe Eduardo de Lima Ragazzi, do Tavares, Ragazzi e Advogados Associados, a decisão do TRT é incomum. "Para configurar sobreaviso, é necessário que o funcionário fique acessível em determinado lugar aguardando o chamado, o que limita sua liberdade de ir e vir", completa.

"Quando ocorrerem restrições por parte do empregador, como por exemplo, limitação de lazer ou de locomoção, mediante proibição do empregado ultrapassar ou sair de determinada região geográfica, a empresa corre o risco de sofrer uma condenação", diz o advogado Orlando Almeida, do Homero Costa Advogados.

Luciana D'Oliveira frisa que, para a configuração do regime de sobreaviso, é imprescindível que tenha ocorrido expressa determinação da empregadora, no sentindo de manter seu empregado dentro de sua residência, restringindo-o de sua liberdade de locomoção. Mesmo assim, segundo Ragazzi, muitas empresas já se "previnem" e até já vedam a utilização de certos sistemas, como blackberry, em casa para funcionários que não ocupam cargos de confiança, exceção feita pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para liberar a empresa do pagamento do sobreaviso. O sobreaviso é calculado sobre a hora normal de cada trabalhador e geralmente fica ao redor de 20%, dependendo de cada convenção coletiva.

Decisão

No processo analisado pelo TRT, o empregado, que entre 2003 e 2010 prestou serviços como cabista para a Brasil Telecom, em diversas cidades da região de Cruz Alta, afirmou que precisava ficar de sobreaviso em alguns finais de semana para atender emergências relacionadas a clientes "supervips", como bombeiros e polícia. Alegou, ainda, que não havia exigências de que ficasse em sua casa, mas que não poderia sair da área alcançada pelo telefone celular. Assim, exigiu pagamento de horas de sobreaviso, conforme norma coletiva da categoria.

A empresa, após decisão de primeira instância, recorreu alegando que a referida norma coletiva prevê o pagamento de horas de sobreaviso quando a exigência impede a realização de atividades sociais do trabalhador, o que não era o caso, já que o trabalhador poderia sair de sua casa e realizar atividades sociais.

Para o relator do acórdão, desembargador Milton Varela Dutra, tanto a obrigação imposta ao empregado de ficar recolhido a sua casa aguardando ordens ou chamados, como a restrição que determine que ele fique ao alcance do telefone celular e próximo o suficiente para viabilizar o pronto-atendimento, configuram sobreaviso, conforme o artigo 244 da CLT. "Quaisquer das condições referidas importam restrição à liberdade do trabalhador, em tempo diverso daquele que, por contrato, está obrigado a dedicar em proveito exclusivo do empregador", disse.